sábado, 24 de abril de 2010

"É como tirar tinta e tela de pintores"

Ex-funcionários salvaram antiga fábrica e levaram dois anos para desenvolver filmes para as velhas câmeras Polaroid
Versão em preto e branco já está disponível; colorida sairá no segundo semestre; documentário traz instantes finais da estética Polaroid
NOVO PB
Fotografia "Paul and Aemily", de Josh Goleman, feita com novo filme preto e branco para as antigas câmeras instantâneas
SILAS MARTÍ
DA REPORTAGEM LOCAL FOLHA DE S.PAULO
Dias antes que desmontassem as máquinas da última fábrica da Polaroid no mundo, fechada há dois anos em Enschede, na Holanda, um grupo de ex-funcionários alugou o galpão para evitar que a linha de montagem virasse sucata. Florian Kaps e André Bosman, os heróis da festa de despedida, passaram os últimos dois anos quebrando a cabeça para reinventar um filme para as antigas máquinas de fotografia instantânea. E acabam de colocar no mercado um filme preto e branco compatível com as 300 milhões de Polaroid vendidas desde os anos 70.
Daqui a dois meses, prometem vender a versão colorida desse novo filme, provando o contrário do que diz o nome da empresa dos ex-funcionários, agora famosa no mundo todo como Impossible Project. "Foi uma invenção tão grande que era preciso preservar isso", conta Marlene Kelnreiter, que faz parte do Impossible Project, à Folha. "É muito diferente de tudo, a textura, o estilo, é impossível de manipular, é algo que fala por si mesmo."
Quando a Polaroid anunciou em 2008 que não fabricaria mais o filme para suas câmeras, causou uma onda de protestos entre fanáticos por sua estética embaçada, distorcida e ultracolorida, além de filas nas lojas. Fotógrafos fizeram estoques caseiros do filme ameaçado de extinção e criaram sites na internet como o Save Polaroid, em que publicam elogios apaixonados ao estilo Polaroid.
"Foi a primeira vez na história que um suporte artístico estava sendo arrancado à força das mãos de quem usava", lembra Grant Hamilton, documentarista que pretende narrar a morte e a ressurreição da Polaroid no filme "Time Zero", que lançará neste ano. "Era como tirar tinta e telas dos pintores."
Ele mesmo um fotógrafo, Hamilton confessa que entrou em pânico quando soube do fim da Polaroid e comprou 60 caixas de filme, guardadas até hoje na despensa de seu apartamento. Em seu documentário, registrou uma série de fotógrafos no suspiro derradeiro, ou seja, quando apertam o disparador para fazer a última foto com filme original. Também foi atrás de representantes da marca, mas ninguém quis falar.
Produtos químicos
Envolvida num esquema de lavagem de dinheiro pelo empresário Tom Petters, agora condenado a 50 anos de prisão, a Polaroid passou de mão e mão entre empresários e hoje trabalha só com fotografia digital. Sua última cartada mercadológica foi contratar a diva pop Lady Gaga como diretora criativa de uma de suas linhas, ou seja, trocou os velhos quadradinhos desbotados por uma estética mais plástica e fantástica.
Enquanto isso, o Impossible Project já circulou seus filmes entre artistas convidados para que pudessem comparar a versão reinventada à original. Mesmo sabendo a receita básica do filme, os novos técnicos não encontravam mais os produtos químicos da Polaroid e substituíram todos um a um até atingir um efeito parecido.
"É o que reclamam os músicos, que dizem que o vinil tem mais interesse do que aquela coisa "cool" do digital", diz Antonio Dias, artista que ainda não aderiu ao novo Polaroid e expõe agora, no Rio, uma série de imagens que fez nos anos 80 com o filme original. "É uma coisa muito imediata, não pode se arrepender e reconstruir."

THE IMPOSSIBLE PROJECT
Como comprar: filme com oito poses é vendido a US$ 21 (R$ 37) em www.the-impossible-project.com

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