Esse é o objetivo da declaração apresentada no Rio de Janeiro, no dia 11 de fevereiro, pelos co-presidentes da Comissão Latino-Americana sobre Drogas e Democracia, os ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso, do Brasil, e César Gaviria, da Colômbia. O documento, que defende a ineficácia da estratégia de “guerra às drogas” aplicada há décadas na América Latina e propõe uma política de combate às drogas mais segura, humana e eficiente, será levado à reunião da Comissão de Drogas Narcóticas da Organização das Nações Unidas (ONU), que acontecerá em março, em Viena, na Áustria.
A partir da discussão junto a especialistas, a Comissão concluiu que a violência e a corrupção associadas ao tráfico de drogas e a políticas ineficazes de combate estão corroendo a cultura cívica e as instituições democráticas na América Latina. “Em muitos países, o narcotráfico está gerando uma crescente criminalização da política e uma politização do crime que ameaçam as instituições democráticas”, defendeu Fernando Henrique. Intitulada Drogas e Democracia: Rumo a uma Mudança de Paradigma, a declaração propõe: o tratamento das drogas como uma questão de saúde pública; a redução do uso de drogas através de campanhas de informação e prevenção inovadoras; e a focalização da repressão sobre o crime organizado.
De acordo com a Comissão, dez anos depois da implementação das políticas de drogas mundiais, lideradas pelos Estados Unidos e pela ONU, baseadas na repressão à produção e criminalização do consumo, não houve redução da produção nem queda do consumo de drogas: “Estamos mais longe do que nunca do objetivo de erradicação das drogas. Mais grave ainda, este enfoque proibicionista tem gerado problemas humanos e sociais gravíssimos, como o aumento da violência e da corrupção na região”, declarou Fernando Henrique. A fim de que cada país da América Latina consiga promover um debate a respeito do problema e propor soluções adequadas às suas história e cultura particulares, a Comissão acredita ter dado o primeiro passo: quebrar o tabu que impede o debate acerca da questão das drogas nas sociedades. “Estamos convencidos de que a luta contra as drogas não é um problema apenas de governos, judiciário e polícia. A redução do consumo de drogas implica uma mudança de mentalidade e de comportamento. A questão precisa ser amplamente debatida, sem medo e preconceito, nas casas, nas escolas, nas igrejas, na mídia”, disse Fernando Henrique.
Outra proposta presente na declaração é a descriminalização da posse de maconha para uso pessoal e a conversão dos dependentes de compradores de drogas no mercado ilegal em pacientes do sistema de saúde. “Tratar o consumo como uma questão de saúde pública é a pré-condição para redirecionar a ação repressiva para seu ponto crítico: o combate implacável ao crime organizado”, explicou Fernando Henrique. E reforçou: “O objetivo é eliminar o tráfico, não o traficante”. Antanas Mockus, ex-prefeito de Bogotá e membro da Comissão, complementou: “Não se ganha nada proibindo o uso de drogas se esta ação, apesar de proibida por lei, é aprovada pela sociedade.”
Também estavam presentes à reunião os seguintes membros da Comissão: Diego García Sayán, ex-Ministro da Justiça e Ministro do Exterior do Peru; Patrícia Llerena, juíza da Argentina, General Alberto Cardoso, ex-Chefe do gabinete de Segurança Institucional; e João Roberto Marinho, diretor do jornal o Globo. Membro do secretariado da Comissão, Rubem Cesar Fernandes, diretor executivo do Viva Rio, também participou da reunião. Iniciativa dos ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso, César Gaviria e Ernesto Zedillo, do México, e composta por 17 personalidades de diversos países da região, entre elas os escritores Paulo Coelho, do Brasil, Mario Vargas Llosa, do Peru, e Tomás Eloy Martinez, da Argentina, a Comissão foi criada com o objetivo de avaliar a eficácia e impacto das políticas de combate às drogas e formular recomendações para políticas mais eficientes, seguras e humanas.
A declaração e as propostas da Comissão estão disponíveis no site www.drogasedemocracia.org
