Hoje, 13 de junho, é dia de festa para Santo Antônio. Com uma biografia que o coloca entre os doutores da Igreja, ou seja, os que tinham um domínio significativo da teologia católica, não é que o franciscano se tornou uma das mais populares figuras do catolicismo?
A santo Antônio são atribuídos milagres espetaculares, como o de que a sua pregação despertou os peixes diante da insensibilidade do público humano que deveria ouvi-lo.
Embora franciscano e, portanto, adepto do lema “paz e bem” da ordem, no encontro entre o catolicismo e o candomblé baiano, Antônio foi associado ao dinâmico Ogum, dono dos metais dentre os quais as armas.
Alguns estudiosos apontam esta associação como resultado de uma experiência póstuma de Santo Antônio como soldado. Conta a tradição que Santo Antônio andou aparecendo em campos de batalha para ajudar portugueses, mas também brasileiros, dentre outras peripécias militares. Ele chegou a mudar de patente e ganhar soldo que era repassado às administrações de igrejas em sua homenagem.
Sem falar que não são poucas as histórias na Bahia em que ele se tornou rico, pois era costume que devotos sem herdeiros deixassem terras e outros bens para ele.
Sem dúvidas, este encontro entre Santo Antônio e Ogum alimentou muito sua popularidade na Bahia. Antônio é também considerado santo das causas impossíveis. Imaginem quantas dessas o povo baiano, majoritariamente negro, enfrentou e enfrenta. E não custa lembrar que Ogum é o senhor dos caminhos e guerreiro.
Se no candomblé que cultua Ogum, festa e comida fazem parte do rito, Antônio é um dos santos que mais estimulam a criatividade culinária. Mugunzá, lelê, pamonha, canjica e tantas outras iguarias acompanham as rezas em sua homenagem chamadas trezenas, por durarem treze dias, de 1 a 13 de junho.
Neste momento fico aqui presa da nostalgia lembrando as trezenas de Santo Antônio feitas por dona Judite lá em minha querida Iaçu. Na minha época de criança contava os minutos para acabar a celebração na igreja matriz para chegar a hora da trezena de dona Judite.
Era uma beleza e com abertura para o clima lúdico. Se uma das senhoras esquecia ou errava um trecho da ladainha era riso para todo lado. Mas logo todo mundo se recompunha e recomeçava.
E que maravilha da cultura popular aqueles cânticos! Após a reza era a hora da comida e dos jogos, como o “correio de Santo Antônio”. Passavam uma caixa de sapato forrada, onde vinham vários bilhetinhos com autoria atribuída ao homenageado.
Cada participante tirava um que trazia desde boas notícias, tipo “Santo Antônio mandou dizer que você vai ganhar um dinheiro inesperado” até puxão de orelhas como “Santo Antônio disse que é para você deixar de falar da vida dos outros”.
Vale lembrar também que é a Santo Antônio que recorrem os desesperados nas mais variadas situações, o que lhe valeu o título de advogado, padrinho (minha mãe o chama assim).
Ele tem fama de encontrar objetos perdidos e de arrumar marido para as moças ansiosas por um. Abro um parêntese aqui para dizer que neste particular sou adepta da teoria da minha mãe, dona Nazinha, que diz que para marido não há santo mais eficiente do que São José.
Segundo ela, este foi um bom esposo (Antônio, padre que era, não se casou). Ainda de acordo com minha mãe, Santo Antônio vive tão agoniado com pedidos nas mais variadas áreas que não tem lá muito tempo para escolher pretendente. Mas como não gosta de negar nada a quem por ele, dá o que aparecer. Um perigo! Por isso, meninas, atenção: São José pode ser melhor negócio!
Mas nem todo mundo ouve as sábias palavras de dona Nazinha. Tenho uma amiga, por exemplo, que mantém uma imagem de Antônio amarrada com uma corda, de cabeça para baixo, no seu guarda-roupa, com direito a palmadas periódicas. Ela me garante que ele a tem ouvido, mas vai continuar lá, de castigo, até que ela encontre seu par definitivo.
Brincadeiras à parte, isto só mostra o quanto Santo Antônio é intrigante, afinal com qual santo se toma tantas liberdades, como se diz aqui na Bahia?
Daí que sua popularidade merece reverência. Viva Santo Antônio, com licença também para saudar Ogum, Nkosi e as divindades que a sabedoria dos nossos antepassados consideraram semelhantes.
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