Escrevo este artigo como uma ficção embasada por minha experiência em consultoria para governos e empresas, os conceitos que dela derivam e as visões de futuro que resultaram dos workshops que realizamos. Parto de dois temas com os quais atuo e que são fundamentais (1) economia criativa: a grande estratégia de desenvolvimento sustentável do século XXI (2) criar futuros desejáveis: um processo essencial para gerar motivação, inovação e oportunidades.
Olhando imagens e visões do “passado do futuro” fica claro que aquilo que vivemos hoje foi antes sonhado: telecomunicações, computação, carros, cidades, medicina diagnóstica, formas de lazer. Através dos meios de comunicação isso mobilizou nosso desejo e inseminou o presente. Agora, é a nossa vez de sonhar e criar novos modelos de vida e negócios que possam ser sementes de futuro e sirvam para orientar nossas escolhas do presente.
ESTAMOS EM 2020. Já está acontecendo a mudança de época que marca a passagem de milênios onde a vida se organizava em torno do material, tangível e finito (terra, ouro, petróleo) para essa outra época onde o intangível é o elemento central. Isso porque na última década governos e empresas tiveram necessariamente que trabalhar a partir da centralidade dos recursos que são infinitos, se renovam e multiplicam como o uso: cultura, criatividade e conhecimento. Ficou claro que não haveria possibilidade de desenvolvimento, sustentabilidade e qualidade de vida se os modelos econômicos e sociais seguissem baseados na exploração dos recursos materiais, que são finitos. Vimos a desmaterialização da economia e foi preciso aprender a fazer dos recursos intangíveis a “matéria prima” e a essência de uma nova economia da abundância, potencializada pelos infinitos oferecidos pelas novas tecnologias e a organização em redes e coletivos. Foi preciso criar novos modelos que não apenas tivessem resultados econômicos, como também resultados nas dimensões social, ambiental e cultural/simbólica (o quadripé da sustentabilidade). Foi aí que a Economia Criativa se consolidou como a grande estratégia de desenvolvimento sustentável para o Século XXI.
Uma notícia que acelerou essa mudança foi o fato da China, após a crise financeira de 2008, ter adotado a Economia Criativa como estratégia número 1 de desenvolvimento para o país (Isso é real! Não é ficção…) Muitos países, como o Brasil, desconheciam esse fato e governo e empresas seguiam adotando políticas e prioridades obsoletas.
Nos últimos anos as empresas perceberam que produtos e serviços se assemelham, e preço e qualidade são premissas, não diferenciais. Aquilo que pode ser garantia de longevidade, atratividade e fidelização é intangível: marca, design, inovação, atributos culturais, responsabilidade social e ambiental, liderança. Produtos e serviços se distinguem pelo tipo de experiência que provocam (hoje, o motor da economia é menos o produto ou serviço e mais a experiência vivida, por isso turismo e entretenimento crescem tanto). Valores não são mais medidos apenas quantitativamente mas qualitativamente. Mede-se não apenas resultado (visão de curto prazo) mas principalmente impacto (visão de médio prazo). A reputação é a grande medida para o valor de uma empresa e instituição, é o que garante a sua capacidade de seguir atraindo colaboradores para suas equipes e consumidores que desejem seus produtos e serviços.
Vamos agora analisar alguns dos elementos que tornaram possível essa mudança, que segundo os analistas atuais colocou o mundo numa agenda que pode representar a solução para muitos dos maiores problemas do planeta e humanidade.
Era da Informação ou Era da Criatividade?
Nesta década ficou claro que a questão central não é tanto a informação disponível como a cultura e criatividade que nos dão a capacidade de usá-la. Um paralelo: ter os ingredientes não significa ter o bolo. Falta a receita, o processo, o saber que/como usar. Isso orientou a reformulação das empresas nesta década.
De produtos a processos
Nossos sonhos do passado mostravam um futuro onde a tecnologia, os produtos inventados, eram a solução para tudo. Hoje sabemos que a tecnologia é meio, não fim, e isso reforçou ainda mais a necessidade de processos: mudar o jeito de pensar e fazer. Resultado: passamos de “consumidores” a “desfrutadores”, a chave agora está na experiência, em desfrutar algo e não consumir este algo.
Ecologia Sócio cultural
Consideramos não apenas a ecologia ambiental (tangível) do século XX como a ecologia sócio cultural (intangível), essa nova disciplina que integra de forma sistêmica as muitas disciplinas ligadas ao humano. Os ecólogos sócio culturais são novos profissionais que tem papel central na tomada de decisão, nas esferas pública e privada, e unem comunicação, cultura, direito, economia.
Modems e conectores:
No século XX as telecomunicações e computação puderam evoluir graças ao “modem” e sua capacidade de integrar e colocar em contato linguagens e sistemas diferentes. Neste século XXI, a mudança de época para a centralidade do intangível e da economia criativa só foi possível graças a profissionais e instituições que atuaram como “modem”, como conectores. Formamos novos profissionais, empresas e instrumentos que são “modems” promovendo a necessária integração entre áreas de governo, setores de negócios, disciplinas.
Capital social, confiança, auto estima.
Com medo e sem auto estima não há auto confiança, portanto não há confiança interpessoal o que resulta na falta de capital social. E a chave de desenvolvimento está no capital social – o único que nos falta. A comunicação em 2020 é da boa notícia, da diversidade cultural, da valorização do santo de casa para que ele faça milagres, de tudo o que fortalece cooperação e a auto estima.
Tempo: único recurso não renovável
Os futuros desejáveis postados na nossa wikifuturos revelam que para muitos o tempo é o recurso mais precioso. E o único que de fato não se renova… As novas tecnologias permitiram que conquistássemos o espaço e a quantidade: estamos em muitos lugares simultaneamente. Mas com isso perdemos o tempo e a qualidade… Empresas em 2020 não apenas nos ajudam a otimizar o tempo como nos ajudam a resgatar e ampliar o desfrute, a intensidade, o sentido que estavam se perdendo na primeira década deste século.
Conseqüências e escolhas
Entre 2010 e 2020 o excesso de informação e demanda, a escassez de tempo e a urgência na mudança rumo à sustentabilidade fizeram com que saber escolher e ter percepção das conseqüências de cada ato fossem prioridade. A Comunicação tornou-se a ferramenta para facilitar escolhas e explicitar conseqüências.
Conclusão:
Nossa capacidade de criar e comunicar (associada a linguagem, símbolos, escrita, imprensa, tecnologia digital) permitiu imensos saltos evolutivos em nossa história. O futuro ainda não é. Pode ser de muitas maneiras. Sabendo para onde queremos ir, temos o poder de semear as idéias, visões e processos que podem construir o mundo melhor que não apenas é desejável, como possível.
* Lala Dehenzelin é especialista internacional em economia criativa, sustentabilidade e futuros trabalho realizado através de consultoria, palestras e oficinas para empresas, governos e instituições multilaterais. Saiba mais em www.laladeheinzelin.com; www.criefuturos.com; www.wikifuturos.com
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