O primeiro ponto de debate quando o tema é cultura diz respeito à sua própria definição. A menção à cultura como o que singulariza as pessoas e os grupos, uns com relação aos outros*, é comumente defendida e cobre praticamente todas as criações de um determinado povo, além de seus valores e formas de comportamento. Fala-se assim de cultura brasileira, alemã ou vietnamita; de cultura gaúcha, paulista ou paraense. Seguindo essa linha, a Constituição do Brasil define (art. 216):
“Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem:
I – as formas de expressão;
II – os modos de criar, fazer e viver;
III – as criações científicas, artísticas e tecnológicas
IV – as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais;
V – os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico”.
Entretanto, vários outros significados somam-se a este, conforme o contexto e a formação de quem o esteja empregando até que, de forma mais ampla, cultura incorpora tudo o que o homem cria. Assim, as estatísticas da cultura da UNESCO compreendem categorias tão distintas como herança cultural: literatura e impressos; música; artes ao vivo; audiovisual; atividades socioculturais; esportes e jogos; ambiente e até mesmo natureza. Na antropologia, o termo cultura é utilizado para designar um modo de viver. Na psicologia social, “cultura engloba alguma forma nova de comportamento comunicada aos outros membros da espécie, de tal maneira que se torna um hábito comum para grande número desses” **.
Para os artistas de forma geral, cultura é tudo aquilo que os inspira e se concretiza em obras de arte, sendo várias as menções bibliográficas que utilizam cultura e arte de forma praticamente sinônima. Aqui, consideramos cultura como a produção material e imaterial de uma sociedade e que lhe dá seu caráter distintivo. Assim, inclui, mas não se limita à produção artística. Cultura, aqui, abrange desde a produção de elementos da chamada indústria cultural, como livros, revistas, jornais, filmes, vídeos e CDs, até o fruto do trabalho dos nossos milhares de cozinheiros, escultores, paneleiros, rendeiras, tapeceiros e tantos outros que encantam por sua singeleza de criadores anônimos. Quando mencionamos “projetos culturais”, estamos fazendo menção a projetos que utilizam formas de manifestação validadas como expressões de um povo, englobando desde produções artísticas e festas folclóricas, até pesquisas linguísticas e resgates do patrimônio histórico.
A arte, por seu lado, é tomada como canal de comunicação da cultura e sua forma de expressão mais flagrante. O artista é considerado um vanguardista intuitivo, capaz de contextualizar no presente elaborações ainda flutuantes no inconsciente coletivo. Ele utiliza o vocabulário da estética para dar voz a nossos sentimentos e pensamentos, para pôr em contato fragmentos incomunicáveis de nós mesmos. A arte é considerada aqui sem julgamento estético e entendida de forma adimensional, tocando valores e emoções alheios a qualquer fronteira geográfica ou temporal, viajando com a mesma leveza entre o resgate do passado e concepções futuras; recuperando o conceito tão desgastado de ser humano universal.
* - Brébisson, Guy de. Le Mécénat
** - Klineberg, Otto. Psicologia Social, p. 44
FONTE: Marketing Cultural e Financiamento da Cultura – Ana Carla Fonseca Reis – Thomson, 2003
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